Interromper o desmatamento é a medida mais importante que o Brasil pode adotar até 2050

Estudo científico reforça a centralidade do Brasil na mitigação das mudanças climáticas e que soluções baseadas na natureza são capazes de render frutos mais rápido e atingir as metas brasileiras antes mesmo que grandes projetos.

Sem a implementação de soluções baseadas na natureza, especialmente encerrando o desmatamento e restaurando a vegetação nativa, o Brasil comprometeria suas metas de Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC), incluindo a obtenção de emissões líquidas zero de gases de efeito estufa até meados do século, de acordo com uma pesquisa publicada no final de outubro (2023) por uma equipe internacional liderada pela Universidade de Oxford.

O estudo também concluiu que interromper o desmatamento é a medida de mitigação mais importante que o Brasil pode adotar em direção às emissões líquidas zero até 2050, ao mesmo tempo em que evita a perda de biodiversidade. Os resultados foram publicados na revista Global Change Biology.

A equipe de pesquisa projetou as emissões de gases de efeito estufa (GEE) do Brasil até 2050 sob diferentes cenários políticos por meio de uma abordagem de modelagem integrada. Isso comparou as reduções potenciais de emissões resultantes de soluções baseadas na natureza (incluindo restauração em larga escala) com soluções técnicas, como bioenergia com captura e armazenamento de carbono (BECCS), além de seus custos econômicos relativos.

Os resultados indicaram que as soluções baseadas na natureza poderiam mitigar quase 80% da meta de zero emissões líquidas do Brasil, reduzindo em média 781 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2) por ano no Brasil durante os próximos 30 anos. Eliminar tanto o desmatamento legal quanto o ilegal e promover a restauração em larga escala têm o potencial de manter o Brasil em um caminho claro para emissões líquidas zero de GEE por volta de 2040, sem a necessidade de implantar tecnologias de emissões negativas custosas e ainda não maduras.

Em países com rica biodiversidade e baixas emissões a partir de combustíveis fósseis, como o Brasil, as agendas climáticas e de biodiversidade estão profundamente interligadas, e as metas de Contribuição Nacionalmente Determinada dessas nações devem alinhar objetivos climáticos e de biodiversidade.

A autora principal do estudo, Dra. Aline Soterroni (The Agile Initiative, Universidade de Oxford), afirmou: “O controle do desmatamento e a restauração da vegetação nativa estão prontos para serem implementados imediatamente a um custo relativamente baixo, quando comparados a soluções técnicas como BECCS. Isso confere ao Brasil uma vantagem comparativa em relação a outros países. É também uma situação de ganho triplo, pois a implementação cuidadosa de soluções baseadas na natureza ajuda a mitigar e se adaptar às mudanças climáticas, conter a perda de biodiversidade e apoiar a economia.”

Entretanto, alcançar isso exigiria políticas nacionais que vão além do atual Código Florestal do Brasil. Os pesquisadores constataram que a implementação do Código Florestal do Brasil sem ações adicionais reduziria as emissões de GEE em 38% até 2050, ficando muito aquém da meta de zero emissões líquidas.

A Dra. Soterroni acrescentou: “Embora a implementação do Código Florestal seja urgente e possa permitir que o Brasil alcance e aumente sua ambição climática de curto prazo, não será suficiente para atingir a meta de emissões líquidas zero até meados do século. Os esforços econômicos necessários para ir além do Código Florestal seriam pelo menos três vezes menos custosos do que os associados ao BECCS, reduzindo os riscos de impactos prejudiciais das mudanças climáticas.”

O Professor Roberto Schaeffer, docente do Programa de Planejamento Energético (PPE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro e coautor do estudo, afirma que: “a agricultura é o segundo setor que mais emite gases no Brasil e é considerada difícil de mitigar. O setor energético do país já possui uma parcela significativa de energias renováveis, e sua contribuição para a ambição de emissões líquidas zero do Brasil dependeria fortemente de BECCS. Soluções baseadas na natureza, em particular encerrar o desmatamento e restaurar a vegetação nativa, são a abordagem correta aqui, uma vez que a implementação de tecnologias de emissões negativas será muito cara e, mais importante, arriscada, já que essas tecnologias ainda não foram comprovadas em escala.”

Antes da cúpula COP28, os pesquisadores estão chamando a atenção para que as soluções baseadas na natureza sejam integralmente representadas nas metas climáticas nacionais, incluindo as do Brasil.

A Professora Nathalie Seddon, docente de biodiversidade e diretora fundadora da Iniciativa Ágil, disse: “Existe uma lacuna entre a ambição climática atual e a implementação das políticas climáticas no Brasil, impulsionada pela conversão de ecossistemas nativos ricos em carbono e biodiversidade. O Brasil abriga cerca de 20% das espécies do mundo, portanto, a conversão contínua de ecossistemas ameaça a integridade de toda a biosfera. É realmente importante apoiar o Brasil em seus esforços para fortalecer, aplicar e ir além das leis existentes para eliminar o desmatamento legal e ilegal.”

Segundo os pesquisadores, o plano de emissões líquidas zero do Brasil deve considerar a urgência de interromper o desmatamento, a necessidade de aumentar os investimentos em práticas agrícolas sustentáveis e fontes de energia renovável, a importância de promover projetos de alta integridade para compensar emissões residuais e a consistência com uma transição justa e equitativa.

Para ler o artigo completo, acesse: Nature-based solutions are critical for putting Brazil on track towards net-zero emissions by 2050

Fonte: Juliana Zambelo – EcoDebate; Raisa de Ramos Pina – IPAM Amazônia

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