Uma avaliação do contexto do estado de Rondônia em 2024, suas implicações socioambientais e correlações no cenário de mudanças climáticas.
Segundo dados do Monitor do Fogo do MapBiomas, mais de 30,8 milhões de hectares foram queimados no Brasil no ano de 2024, o que representa um aumento de 79% em relação a 2023, ou um crescimento de 13,6 milhões de hectares. Dessa porção queimada, três a cada quatro hectares foram de vegetação nativa (75%), sendo as formações florestais as mais afetadas, com cerca de 25% da área queimada no país.
Segundo destaque de Ane Alencar, diretora de Ciências do IPAM e coordenadora do MapBiomas Fogo, em 2024 foi um ano atípico de fogo no Brasil, com foco grande de queimadas em todos os biomas, sendo as áreas florestadas mais atingidas. Além disso, Ane explica que “Os impactos dessa devastação expõem a urgência de ações coordenadas e engajamento em todos os níveis para conter uma crise ambiental exacerbada por condições climáticas extremas, mas desencadeada pela ação humana como foi a do ano passado.”
Intensificação das queimadas e correlação com a intensificação das mudanças climáticas
O aumento das áreas queimadas está ligado aos efeitos do período de seca acumulados durante um grande período que se instaurou em grande parte do país, e esses efeitos estão associados ao “El Niño” entre os anos de 2023 e 2024. A característica principal desse “El Niño” foi a seca nas regiões Norte e Nordeste e um período chuvoso nas regiões Sudeste e Sul.
Esse desequilíbrio é sistêmico e está ligado também aos desastres que ocorreram no Brasil em 2024, como é o caso das enchentes no Rio Grande do Sul, como explica Giséli Almeida (2024) em sua monografia, onde:
As enchentes no Rio Grande do Sul ocorreram por consequências climáticas, devido há insuficiência de absorção do gás carbônico da atmosfera pela floresta Amazônica, que acontece pelo excesso de poluição ocasionado pelas queimadas. Aumentando o efeito estufa ocasionando o aumento das temperaturas deixando mais secas as pastagens, diminuindo o retorno das chuvas aos lençóis freáticos aumentando o risco de foco de incêndios e queima descontrolada em algumas regiões causando um desequilíbrio climático. (p. 9)
Totalidade das queimadas em Rondônia
No caso de Rondônia, entre os meses de janeiro e setembro de 2024, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou 7.282 focos de incêndios no estado, sendo o maior número nos últimos 14 anos. Ao comparar com o ano de 2023, houve um aumento de 169%. A capital Porto Velho é o município com o maior número de focos de incêndios, correspondente a 32% do total do estado, com cerca de 2.337 pontos.
O estado de Rondônia teve um total de 1,4 milhões de hectares queimados em 2024, o que representa um crescimento de 72% em relação ao saldo de 2023, de acordo com dados do Monitor do Fogo.

Quantos aos tipos de uso e cobertura afetados, deste total, as áreas de floresta foram as mais impactadas, seguidas por áreas de vegetação herbácea e arbustiva.
Tipo de uso e coberturas afetados | Área queimada (ha) |
Floresta | 694.469 |
Vegetação herbácea e arbustiva | 253.062 |
Agropecuária | 461.380 |
Área não vegetada | 1.228 |
E isso trouxe um grande problema na questão da qualidade do ar dos rondonienses. A empresa suíça (IQAir) registrou desde o fim de julho um dos piores índices de qualidade do ar comparada a outras cidades brasileiras. Com o passar dos dias, o índice de qualidade (IQA) esteve em 893, considerado extremamente perigoso à saúde. Outro agravamento do intenso período de estiagem na região foi a seca que a bacia hidrográfica do Rio Madeira enfrentou, o Rio Madeira atingiu seu pior nível em toda história, causando transtornos sociais e econômicos à população ribeirinha, gerando isolamento e desabastecimento. Além de afetar a saúde pública, a agricultura e também a economia regional.
As unidades de conservação mais afetadas pelas queimadas no estado de Rondônia foram o Parque Estadual Guajará-Mirim, teve mais de 100 mil hectares destruídos pelo fogo, e a Estação Ecológica Soldado da Borracha, com 163 mil hectares destruídos pelas queimadas. E as terras indígenas mais afetadas pelo fogo foram: a Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau e a Terra Indígena Karipuna, Terra Indígena Kayapó e Terra Indígena Sararé. E tanto as Unidades de Conservação e os Territórios Indígenas e Quilombolas, apresentam o mesmo processo de destruição como o desmate, incêndio e grilagem.
Crimes ambientais em retaliação a operações de fiscalização
Segundo o promotor de justiça e coordenador do Grupo de Atuação Espacial do Meio Ambiente (Gaema), Pablo Hernandez Viscardi, o motivo das áreas protegidas serem alvos de crimes ambientais frequentemente, é de um possível apoio político. Pablo ainda destaca que “…os indícios apontam que os incêndios foram causados como retaliações às fiscalizações ambientais, sobretudo àquelas realizadas na Operação Mapinguari, realizada pelo MP-RO: a maior ação de desocupação em unidades de conservação já realizada em Rondônia.” Que teve como consequência a prisão de mais de 10 pessoas além da retirada de 2 mil cabeças de gado e de estruturas irregulares de invasores na região do Parque Estadual Guajará-Mirim.
Referências:
OBSERVA RONDÔNIA. Incêndios: Terras indígenas em Rondônia estão sofrendo com o fogo, 24/09/2024. Disponível em: https://observaro.org.br/incendios-terras-indigenas-em-rondonia-estao-sofrendo-com-o-fogo/. Acesso em 12/02/2025.
OBSERVA RONDÔNIA. Porto Velho: Na capital com pior qualidade do ar no Brasil nos últimos meses, fumaça não é prioridade, 01/10/2024. Disponível em: https://observaro.org.br/porto-velho-na-capital-com-pior-qualidade-do-ar-no-brasil-nos-ultimos-meses-fumaca-nao-e-prioridade/. Acesso em 12/02/2025.
ALENCAR, Ane. “Área queimada no Brasil cresce 79% em 2024 e supera os 30 milhões de hectares”. MapBiomas, 22/01/2025. Disponível em: https://brasil.mapbiomas.org/2025/01/22/area-queimada-no-brasil-cresce-79-em-2024-e-supera-os-30-milhoes-de-hectares/. Acesso em 30/01/2025.
GADELHA, Jose. “O sufocante ar de Rondônia”. Radis, 01/09/2024. Disponível em: https://radis.ensp.fiocruz.br/reportagem/queimadas/o-sufocante-ar-de-rondonia/. Acesso em 30/01/2025.
ALMEIDA, Giséli Anastácia Pasini de et al. O impacto ambiental das queimadas e do desmatamento na floresta amazônica nos últimos 35 anos. 2024. Disponível em: https://dspace.unipampa.edu.br/bitstream/riu/9913/1/Gis%c3%a9li%20Anast%c3%a1cia%20Pasini%20de%20Almeida%202024.pdf. Acesso em 30/01/2025.
“Rondônia enfrenta recorde de queimadas em 2024”. O Antagonista, 2024. Disponível em: https://oantagonista.com.br/brasil/rondonia-enfrenta-recorde-de-queimadas-em-2024/. Acesso em 30/01/2025.
LIMA, Valdemir Costa et al. Crimes contra o meio ambiente: uma análise sobre as queimadas na Amazônia Legal e suas implicações jurídicas. Meio Ambiente (Brasil) , v. 3, 2025. Disponível em: https://meioambientebrasil.com.br/index.php/MABRA/article/view/477. Acesso em 31/01/2025.
CRUZ, Jaíne Quele. “Unidades de conservação destruídas por incêndios criminosos já foram alvos de normas de redução e extinção”. Globo, g1 RO, 13/10/2024. Disponível em: https://g1.globo.com/ro/rondonia/noticia/2024/10/13/unidades-de-conservacao-destruidas-por-incendios-criminosos-foram-alvos-de-normas-de-reducao-e-extincao.ghtml. Acesso em 03/02/2025.